quinta-feira, 7 de novembro de 2019

As Origens do Flamenco

"Eu não sou desta terra, nem conheço ninguém..."

   
Como nesta arte nada é simples, determinar a definição da origem exata do termo “ flamenco " se torna quase um desafio. Existem várias teorias sobre a gênese dessa palavra, uma das mais difundidas é a defendida pelo historiador andaluz  Blas Infante Pérez de Vargas em seu livro Orígenes de lo Flamenco y Secreto del Cante Jondo, escrito em 1933. Segundo o historiador, a palavra "flamenco" deriva dos termos hispano-árabes "Felah Mengu", que juntos significam " camponês expulso ou camponês fugitivo ".



Imagem da viagem de Blas Infante a Agmat, Marrocos (1924)
Para Blas Infante, a origem histórica do flamenco está na conquista castelhana, que força os mouros a aproveitar a hospitalidade cigana:

“Bandos errantes e perseguidos vagueiam de um lugar para outro e constituem comunidades comandadas por líderes e abertas a todos os peregrinos desesperados, lançados da sociedade para o infortúnio e o crime. Basta cumprir um rito de iniciação para entrar entre eles. Eles são os ciganos (gitanos). 
    É assim que os andaluzes, "os últimos descendentes de uma das mais belas culturas do mundo", entram em bandos nas comunidades gitanas - em árabe, " camponês expulso ou camponês fugitivo " significa felah mengu - e ali começa a elaboração do flamenco clandestino, um nome que não aparece publicamente até o século XIX, quando a perseguição cessou”.
   Para chegar a essa teoria original e controversa, Blas Infante dedicou boa parte de seu livro a desmontar as várias teses que queriam explicar a origem do flamenco por meio da análise etimológica dessa palavra.
O berço do flamenco
    O Flamenco nasceu na Andaluzia, Sul da Espanha, em locais como Sevilha, Jerez de La Frontera e Cádiz. Entre os vários povos que contribuíram para a formação da cultura e arte flamenca destacam-se:
·          O POVO ANDALUZ - os íberos que se localizavam na parte Sul da Espanha, também conhecidos como "El Pueblo Tartésico", que se estabeleceram no vale "Del Guadalquivir" por tanto tempo ou mais que os descendentes das dinastias egípcias às margens do Nilo. Era um povo muito ligado à espiritualidade, magias e fantasias.
·          OS ÁRABES - dois povos invadiram a Espanha por volta do século VII. Ligados pela religião Maometana, um desses povos era procedente da Ásia, região de Damasco e o outro era formado pelos Berberes ou Mouros, provenientes do norte da África. Esses povos fundiram seus costumes e seus elementos culturais, música e dança principalmente, cuja descendência temperamental revela a união sanguínea Andaluzo-Moura. Como influência direta podemos citar o Cante Flamenco, cujas características assemelham-se muito às orações maometanas.
·         OS GITANOS - a palavra gitano (cigano), provém do espanhol antigo “egiptano”, ou seja, egípcio. As primeiras imigrações de que se têm notícia ocorreram entre os anos de 1445 e 1447, época do reinado de Aragón Alfonso V. Neste período, uma importante tribo gitana entrou na Espanha por Barcelona, espalhando-se por toda península ibérica. 
Em outubro de 1996, o Parlamento da Andaluzia declarou o dia 22 de novembro como o Dia dos Ciganos da Andaluzia para celebrar a singularidade desse grupo étnico que selou seu vínculo com a Andaluzia geração após geração

    Os ciganos têm um importante papel no desenvolvimento do flamenco. Com a intenção de abandonarem a Índia (séc. XIV) após uma série de conflitos bélicos e invasões de conquistadores estrangeiros ocorridas em vários territórios, os ciganos foram para o Egito onde permaneceram até sua expulsão. Conscientes de que deveriam se dividir em grupos para assim conquistarem a Europa, uma parte desses povos se estabeleceu na Espanha por volta de 1425, trabalhando como pastores e artesãos. Os ciganos se estabeleceram em diversas regiões, entrosando-se muito bem com a população nativa. Mas é na Andaluzia que isto se dá mais intensamente; daí as origens do cante aparecerem sempre intrinsecamente relacionadas com as localidades andaluzas onde havia importantes gitanerias (núcleos urbanos com forte presença cigana). Durante essa época, os ciganos conheceram um período de paz que lhes permitiu certa integração com o folclore andaluz.
   Decretada a perseguição às tribos nômades pela Coroa de Castella em 1499, e com a expulsão dos não cristãos e os de raça considerada impura como os judeus, ciganos e árabes por meio de medidas severas adotadas pela Santa Inquisição, os grupos foram obrigados a se estabelecer nas montanhas e outros locais desabitados para sobreviverem. Com o convívio e mistura dos diferentes costumes e tradições dessa gente perseguida, foi surgindo uma nova forma de expressão cultural. Nascia a música flamenca e a arte do flamenco. O cante é marcado pela melancolia, pelo fatalismo e pelo sentimento trágico da vida. Nascia aí o cante jondo. Para os ciganos a música é parte integrante do dia a dia e essencial nas datas festivas. Tudo o que necessitam para iniciá-la é uma voz e acompanhamento rítmico, como palmas ou golpes dos pés no solo.
   A Espanha foi uma das primeiras nações a adotar disposições coercitivas contra os povos ciganos, sendo que a primeira disposição legal foi aquela no ano de 1499. Em 1528, novas disposições foram ditadas contra eles, referindo-se ao estilo de vida errante que levavam porque não tinham ofício para o próprio sustento, viviam de esmolas e da venda de objetos de metal, "enganavam" as pessoas com o uso da magia, além de praticarem contrabando e furto. Como condenação à vadiagem eram açoitados, escravizados e presos.
   Essa perseguição continuou até 1783, quando Carlos III lhes concedeu os mesmos privilégios dos demais habitantes. Há que se ressaltar que quando os ciganos se estabeleceram na Andaluzia passaram a exercer ofícios como ferreiros e comerciantes de roupas e utensílios.
   De acordo com o flamencólogo Faustino Nuñez, “o fato de se chamar de gitanos a todo um conjunto de povos/raças e culturas a partir do século XVI, sobretudo na Andaluzia, explica o porquê dos gitanos andaluzes serem os únicos a cantar flamenco e não o resto. Os ditos gitanos da Andaluzia, especialmente os de Cádiz e Sevilha, formarão um caldo cultural nunca visto até então, daí sua música ser das mais mestiças de todo o planeta. Isso nos leva a crer fortemente na hipótese mourisca de Blas Infante, ou seja, que os gitanos não eram só gitanos, pois o termo abarcava todos aqueles seres marginalizados e perseguidos pelos reis católicos.
   Outro exemplo mais prático e testemunho muito simples da provável mistura entre árabes fugidos e gitanos são as letras de flamenco que falam constantemente "de La moreria", e de "reinas moras", e de vir de um lugar denominado moro: "yo vengo del moro, del moro, del moro” .
   O fato é que o Flamenco é essa mistura de raças e culturas. Nas suas influências também se encontram o povo judeu e o indiano.
Réplica do escudo de Andalucía, desenhado por Blas Infante, que se encontra 

na fachada de sua Casa em Coria del Río


Fontes de Pesquisa:
Orígenes de lo Flamenco y Secreto del Cante Jondo, Blas Infante Pérez de Vargas;História do Flamenco - 2005, APÓSTILA DIDÁTICA CUADRA FLAMENCA (feita com as seguintes referências:: FLAMENCO . Biblioteca multimedia de la cultura. CD ROM. 1996 ; MEDEROS, Alicia EL FLAMENCO. ACENTO EDITORIAL 1996. España; GRANDE, Felix -MEMORIA DEL FLAMENCO. I. RAICES Y PREHISTORIA DEL CANTE. selecciones Austral ESPASA- CALPE. S.A. MADRID 1979), Vera Alejandra Biglione; Cafés de cante 1864 - 1908. 2011, Faustino Nuñes

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